sábado, 8 de dezembro de 2012

Diário da balança #4: 116(+2)

Ok, eu confesso: dei uma desanimada. Após o ganho de peso na última pesagem chutei o balde. Resolvi aceitar quem sou e tentar viver bem comigo, mesmo que em uma versão plus size. Olhando pelo lado positivo, há mais de mim para amar. Foi uma experiência libertadora. Caminhava mais leve. Até que li essa reportagem e percebi duas coisas importantes. A primeira é que eu achava que andava mais leve devido a redução de sensibilidade no pé causada pela compressão dos nervos. E também que deveria me mexer e voltar para o regime. 
Alexandre, o graaaaaaaande.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Sobre traquinagens e roupas limpas

     Os pais de Adolfinho estavam com um problema: o filho havia aprendido a ajudar nos serviços domésticos. Começou no dia em que ele deixou cair suco na mesa e rapidamente limpou com o guardanapo, mais por medo da repreensão do que por qualquer outro motivo. De qualquer forma, o ato foi interpretado como uma visível evidência de maturidade da criança, e lhe rendeu vários elogios além de um passeio a sorveteria.
     A partir de então ele se tornou preocupado com a organização e limpeza da casa, obviamente para ganhar mais agrados. Alguns dias depois, após vários talheres com restos de comida serem encontrados na gaveta, terem recolhido um saco de ração de cachorro espalhado pelo chão, catar os cacos dos vários enfeites quebrados ao retirar poeira e tomar uma refrescante limonada preparada com água da torneira e adoçada com sal, seus pais resolveram pedir para o  menino ajudar apenas guardando seus brinquedos depois de brincar.
     Entretanto algo havia se modificado na personalidade de Adolfinho. Ele gostava de ajudar. Se sentia importante. Assim, continuou "ajudando" em casa mesmo sem a solicitação parental e, como começou a ser repreendido, passou a fazer suas boas ações escondido. Desta forma, alguns documentos que estavam sobre a mesa foram amassados e jogados no lixo, colheres lambidas e devolvidas as gavetas, pias limpas com escovas de dentes.
     Algum tempo depois o chefe do pai de Adolfinho o convidou para jogar baralho em sua casa. Após muitas recomendações de comportamento no carro chegaram e os adultos iniciaram o jogo. Adolfinho leu as revistinhas e brincou com os bonecos que havia levado, assistiu desenhos e logo se entediou. Saiu brincando de explorador pela casa e, como o planeta visitado possuía fauna muito hostil, prossegui em silêncio se esgueirando pelos cantos sem ser visto pelos gigantes com mãos achatadas que se reuníam em um ritual tribal na sala. A brincadeira o levou ao banheiro e seus olhos brilharam quando ele viu o cesto de roupa suja quase transbordando...
     Finalizado o jogo os adultos agora procuravam por Adolfinho e, ao abrir a porta do banheiro, o viram colocar o último vidro de shampoo no vaso onde as roupas estavam de molho. 

sábado, 24 de novembro de 2012

Por quê(m)?

Quantas vezes justificamos nossas escolhas e ações pelo bem de outra pessoa. Quantas delas de fato serão verdade? Quais serão na verdade decisões tomadas em meu benefício e somente banhadas em altruísmo? Nem sempre é fácil perceber. Muitas vezes estamos inconscientemente escondendo nossos medos atrás do bem fazer ao outro.

domingo, 28 de outubro de 2012

Gengivite causa mais que mau hálito

     Constantemente me surpreendo com a capacidade das pessoas em enxergar apenas o aspecto imediato da vida. Como exemplo vamos ver parte de uma peça publicitária que vem sendo veiculada atualmente.




     Só um pequeno detalhe: gengivite leva a doença periodontal, principal causa de perda dos dentes. Vou colocar em caixa alta: DEPOIS DO MAU HÁLITO VOCÊ PERDERÁ SEUS DENTES, É, VAI FICAR BANGUELA!!! É claro que mau hálito incomoda, mas cá entre nós, uma balinha já ajuda. Já ficar sem os dentes...
     No entanto não estou dizendo que é uma propaganda ruim. Pelo contrário, é uma excelente forma de marketing. Apela para o imediatista que vive dentro de cada um. Ninguém quer perder os dentes mas esse é um perigo para daqui alguns anos, o "bafo" está aqui agora, é o que incomoda no momento. Então o publicitário explora este aspecto, porque sabe que a maioria de nós vive a apagar incêndios e não a prevení-los. Dos dentes cuido depois, não posso é sair com esse bueiro para a balada!
     Então aqui vai o meu conselho para você matar dois coelhos com uma preguiçosa cajadada: use chiclete.


domingo, 5 de agosto de 2012

Diário da balança #3: 114(+4)

Tenho encontrado alguma dificuldade para controlar o apetite após interromper minha medicação. Fiquei um pouco agitado e, em um momento misto de alucinação e hipoglicemia, me peguei mastigando a bengala de uma senhora como se fosse um daqueles doces de filme. Desde então a fome anda furiosa sem o remedinho para aliviar a tensão. Na tentativa de sublimar meus desejos mais sórdidos comprei uma nova série de produtos de cuidado corporal: shampoo de morango, creme hidratante de pera, pós barba de limão, perfume de melancia, etc. Tenho apresentado, entretanto, dois efeitos colaterais. O primeiro é uma boiolice desenfreada, uma vez que minha parte de produtos de beleza é aproximadamente 2x maior do que a da minha esposa. O segundo foi quando comi metade da minha mousse de chocolate para os cabelos .
Alexandre, o graaaaaaaande.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Política mineira

Caminhavam sozinhos, ele mais à direita da esquerda e ela mais à esquerda da direita. Viam o grupo que caminhava um pouco mais ao lado, mas para não abrir mão das suas convicções caminhavam sozinhos, ao centro da maioria. Até que se encontraram e perceberam que, apesar de serem originalmente de lados opostos, no atual cenário estavam juntos. Então criaram seu próprio partido.

sábado, 28 de julho de 2012

Sobre presentes e enxurradas

A família de Adolfinho planejava uma viagem à praia. Era início de dezembro e chovia muito em BH. Sua mãe decidiu que o velho calção de banho dele já havia cumprido sua missão. Então, alguns dias antes da partida, ela chegou em casa com uma sunga nova, amarela marca-texto. Nem é preciso dizer o quato o menino adorou seu presente, tão chamativo quanto o antigo companheiro de aventuras. Em sua cabeça seria como quando os Cavaleiros do Zodíaco usavam suas armaduras douradas ao invés das usuais. E em um instante já corria pela sala com o calção. A mãe de Adolfinho, temendo que antes de ver a areia da praia a sunga já estragasse mandou que o menino a tirasse e ele, a contragosto, obedeceu. Até os Cavaleiros tiveram reveses ao enfrentar Poseidon. A tarde, após sua mãe sair para trabalhar, o destemido cavaleiro recuperou sua armadura dourada e partiu para enfrentar suas inóspitas jornadas em busca do bem - no hall de seu prédio. Foi quando ele viu a grande enxurrada que se formava no meio fio de sua casa...algum tempo depois, quando já voltava para casa, sua mãe pode ver, deitado no meio d'água junto ao meio fio, o solitário Cavaleiro do Zodíaco dourado em sua batalha contra o perverso Poseidon.

domingo, 1 de julho de 2012

O que aconteceria comigo se...

...eu recebesse uma flor.
   Venho caminhando pelo centro e um desses cidadãos caricatos, que toda cidade tem, me entrega uma flor, em um puro e singelo ato de altruísmo. Nesse instante uma abelha saí de dentro das pétalas e me ferroa, dando início a um choque anafilático.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Por que eu demoro no banho

     Se eu bem me lembro das aulas de geografia, a proporção é mais ou menos essa: de toda a água na Terra, 97% é salgada, 2% estão nas calotas polares e 1% estaria nos lagos e rios, sendo esta fração a apropriada para consumo humano. É provável que também venha de alguma dessas aulas a verdade incoveniente do aumento global da temperatura provocado pelos gases estufa, que modificam climas e derretem as tais calotas polares, alterando de maneiras variadas diversos ecossistemas e formas de vida, incluindo a humana. Existem outros exemplos, como a insustentabilidade do uso de combustíveis fósseis e sua poluição, mas acredito que já tenha sido possível captar a idéia (abro aqui um parêntese para agradecer meus professores de geografia, um abraço na família). É preciso preocupar-se com sua "marca" na Terra, ser menos poluente e mais sustentável, atuar pensando na gota e não no oceano, em reciclagem, não usar sacolas plásticas...
     Apesar de conhecer esses conceitos e os achar louváveis, eu demoro no banho. E digo mais, por vezes tomo 3 ou 4 banhos em um dia, sem que isso signifique períodos mais curtos debaixo d'água. A razão básica para fazer isso é simples: eu gosto e pago minha conta de água e luz - sim, ainda é banho quente em muitas vezes. 
     É mais humanitário do que atropelar um morador de rua ou fechar um pobre companheiro de engarrafamentos, aos quais sou submetido em todos os dias (perto ou longe, atualmente em Belo Horizonte você sempre chega atrasado e correndo, não importa se você sai 1 hora antes para chegar a um destino a 5,3 km com estimativa de viagem de 10 minutos). É mais inteligente que brigar com a esposa sem razão só por estar nervoso, uma vez que você paga seus impostos e não são poucos: cerca de 30% do que trabalha na fonte, mais uma quantidade que desconheço embutida em tudo o que consome - e talvez para minha saúde mental seja melhor que eu não saiba mesmo - além de IPVA, DPVAT, IPTU...  para ser assediado quando vai a algum lugar e precisa parar o carro na rua, quando estraga seus pneus ou amortecedores trafegando em ruas e estradas sem condição, quando vê que a educação estatal básica em qualquer esfera produz na verdade analfabetos funcionais, além das farras e mais farras com o MEU dinheiro: estádio para o Corinthians, a lista de gastos mensais com comida para o staff da Roseana Sarney e os dinheiros em cuecas em geral. Enfim, quando penso nessas e outras situações similares, ao invés de colocar uma arma na minha cabeça, coloco a cabeça debaixo d'água - e, reforçando mais uma vez de forma pleonástica, pago por isso.
     Então, após esta introdução e pequeno desenvolvimento, chegamos ao ponto chave que deu origem a este texto: A recentemente finda Rio+20. Somente duas instituições internacionalmente reconhecidas por sua fraqueza em políticas externas, organização e capacidade de ação como a ONU e o governo brasileiro poderiam estar liderando tal movimento. Perdão, movimento implica em sair do lugar, mesmo que para trás, e talvez não seja o melhor termo para "aquilo" que aconteceu. Não que tenha sido uma surpresa. Era uma das pedras mais cantadas da história. O esvaziamento dos debates sem a presença das maiores potências do mundo, preocupadas com seus próprios umbigos sujos nesse "momento" de crise, e uma carta final que não define nada de concreto para que não seja ridicularizada por não ser respeitada depois (ECO 92, Kyoto, entre outros) foi o saldo final do evento. E tudo com o meu dinheiro. O dinheiro dos americanos e alemães não foi desperdiçado nesse teatro, foi possivelmente canalizado para resolução de problemas mais urgentes daquelas sociedades, e não usado na construção de uma passarela para pseudointelectuais profissionais ou de ocasião desfilarem sem deixar nada de saldo. 
     Assim convoco a você, de dread no cabelo e sandália de fibras nos pés (além de possivelmente maconha na cabeça), que acha ótimas campanhas do tipo "Faça xixi no banho" que circularam e circulam pelo país, que tem uma postura engajada, tentando convencer chateando amigos próximos e estranhos no ônibus a plantar uma árvore para amenizar o impacto dos gases estufa quando nascer alguém ou quando há a eliminação natural de metano pelo sistema gastrointestinal humano: faça algo realmente produtivo! Não é me irritando por tomar banho demorado que você vai conseguir resolver alguma coisa. A sociedade organizada deve optar pelo modelo de desenvolvimento que quer e pode custear, formar um governo baseado neste ideal e aí sim poderá ordenadamente chegar a algum lugar - mesmo que o lugar seja o consumo desordenado do meio ambiente. Não seja conivente com o gasto de dinheiro público sem uma finalidade prática. Te aguardo na banheira.

terça-feira, 26 de junho de 2012

Diário da balança #2: 110(-5)

Osúltimosdiastemsidotranquilosdesdequefuiaomédicoecomeceiatomarummedicamentoparareduziroapetitepoisestavadifícildemanteradieta.Efeitoscolaterais?Nãosintonenhum,estouótimoemaisbemdisposto.Aestahorajálaveiobanheiro,prepareioalmoço,fizumrelatóriodotrabalhoeaspireiocarro.Agoraestoudescansandoenquantoescrevo.Adietaestápromissora.
Alexandre, o graaaaaaande.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Sobre manhas e almofadas

Quando ainda era pequeno, com seus dois anos de idade, Adolfinho sofria de "desmaios programados". Era só ser contrariado de alguma forma e ele imediatamente perdia os sentidos, caindo ao solo. Bem, tecnicamente, caía à almofada. É, coincidentemente sempre havia uma almofada a amortecer sua queda. No entanto, na primeira vez que "desmaiou", ele realmente assustou sua mãe. Mas com a repetição de suas síncopes ela acabou se acostumando. E um dia, cansada das atuações, ela aplicou o melhor remédio contra desmaios já inventado: puxou a almofada logo antes dele cair.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Cenários # 2

Era a terceira vez na semana que Carlos acordava na sala de sua casa ao lado de uma poça de vômito próximo ao meio dia. Era uma quinta-feira mas ele havia sido demitido há 15 dias então não se preocupou. Desde que sua esposa foi embora - já não aguentava os desaforos ditos durante a embriaguez, as visitas ao pronto-socorro devido às quedas, a falta de dinheiro e as dívidas pioradas pela bebida - ele se volatara com maior intensidade ao alcoolismo. Ajudava a dormir, a não pensar nos problemas e nos filhos que não via desde então. Mas agora, mesmo ainda sobre o efeito final da embriaguez a saudade dos meninos apertou. Pensou em procurar alguma forma de ajuda, terapia, AA, agarrar-se a alguma religião, fazer alguma coisa para reconquistar aos poucos o que perdeu. Pegou o telefone e ligou para a casa da sogra aonde a esposa estava com as crianças. Não conseguiu falar com elas e ouviu poucas e boas. Aquilo pareceu certo, não era a primeira vez que prometia tomar jeito. Pensou em ir até a igreja da esquina conversar com o padre, talvez ele conseguisse um emprego. Levantou-se, ainda cambaleante, a procura de algo para beber antes de sair...


***

Andrea retorna da visita ao CTI onde seu filho está internado após um acidente com sua motocicleta. Após chegar em casa recebe uma ligação. Atende o telefone e é sua mãe querendo notícias do neto, mas principalmente de sua filha, pois sabe da situação crítica do acidentado#Ele continua do mesmo jeito mãe. O médico disse que seu estado é estável#Não sei filha, estável nesses casos não é bom#Mas ele está assim desde o acidente, tirando a infecção#Então, já tem um mês e não houve melhora, ele não acorda...

*** 

Era véspera de natal e  Paulinho aguardava ansioso pela visita do Papai Noel. Estava agitado e não conseguia dormir, rolando de um lado para o outro na cama. E cada mexida fazia barulho no saco plástico que seus pais usaram para cobrir o colchão tantas vezes usado como banheiro. Com isso seu irmão não conseguia dormir e o xingou#Você pode ficar quieto e dormir!?!?!#Não consigo Dudu, quero ver logo meu presente#Mas com você acordado ele não vem#Eu sei, mas eu quero que chegue logo de manhã#Fica quieto logo menino, a mamãe já comprou seu carrinho de bombeiro!#Mas não é da mamãe, é do Papai Noel...

***

As vezes preferimos a ilusão ao desespero.

domingo, 13 de maio de 2012

Diário da balança #1: = em 115

Ok, eu admito: a primeira batalha foi da balança. Tentei implementar algumas mudanças em meus hábitos de vida e obtive alguns resultados interessantes. Como quando tive uma rápida alucinação durante um pequeno episódio de privação de oxigênio cerebral no dia em que deixei o carro na garagem e subi a pé a rua de casa em direção a padaria para comprar quindins (o que vale é a boa intenção). Enquanto meus neurônios faziam entre si uma disputa de MMA pelas escassas moléculas de O2 fui acionado pela Promotoria da Infância e Juventude devido a denúnicia de Mini Bis₢ abandonados, bem-casados me culpavam pelo seu divórcio, sofri olhares condenadores dos olhos de sogra enquanto suflês jogavam papo de anjo em mim. Foi uma pressão muito grande, gerou uma ansiedade difícil de controlar. Tentei meditação, 12 passos - tive nova privação de oxigênio do sexto para o sétimo passo - tomar água gelada, banho gelado, cogitei começar a fumar maconha, mas no final encontrei o perfeito ansiolítico: strogonoff de frango (mais uma vez o que vale é a boa intenção, poderia ter sido de carne vermelha) acompanhado por 2 litros de Coca Cola₢ e uma barra de Tortuguitas₢ de chocolate branco recheadas com brigadeiro. Planejo uma ofensiva mais eficaz para esta semana. 
Alexandre, o graaaaaaaande.

domingo, 6 de maio de 2012

A presença

   Nestor estava acostumado a sempre dormir acompanhado. Quando pequeno dividia o quarto com seu irmão e após a adolescência estava sempre com alguma namorada ao ir dormir. Eventualmente acabou se casando com uma delas, compraram uma casa nova e, assim, continuava a dormir acompanhado. Até o dia em que sua esposa recebeu uma proposta de promoção desde que trocasse para o turno noturno no trabalho. 
   Mesmo com a resistência de Nestor ela acabou aceitando a mudança e as primeiras noites foram diferentes mas sem maiores problemas. O problema mesmo era no final da tarde quando ele, que havia levantado antes de sua esposa voltar, chegava do trabalho e ela estava se aprontando para ir para o serviço. Magoados, ele com o que considerava um abandono por parte da esposa, ela por considerar uma intransigência a atitude do esposo tentando impedi-la de prosseguir em sua carreira, quase não se falaram por uma semana. 
   Até que ele resolveu surpreendê-la voltando mais cedo para casa com uma garrafa de vinho e flores para fazerem as pazes. Ao chegar em casa ele viu em cima da mesa um bilhete que dizia "Houve um problema no trabalho e tive de ir antes de você chegar". Desapontado abriu a garrafa de vinho e a tomou sozinho. Foi deitar um pouco cambaleante, não estava acostumado com bebidas. Dormiu profundamente até cerca das 3 horas da manhã, quando acordou com a sensação de haver alguém o observando. Olhou pelos cômodos e não tinha nada de diferente. Então voltou a deitar-se.
   No dia seguinte, ao chegar do trabalho,  encontou o mesmo bilhete em cima da mesa. Furioso saiu para comprar uma garrafa de vinho, esperando dormir bem como na noite anterior havia dormido. Enquanto tomava a bebida, já de volta a sua casa, pegou o bilhete e mergulhou apenas uma ponta na taça com vinho, que por capilaridade, tomou conta do papel tornando-o rubro e dissolvendo a tinta de caneta que continha a mensagem escrita. Ao retirar o papel de dentro da taça achou que a tinta preta agora tinha a forma de uma lágrima. Assumiu que estava bêbado e foi deitar. 
   Novamente dormiu profundamente até as 3 horas da manhã quando acordou com a mesma sensação da noite anterior. Um pouco mais assustado desta vez, foi pé ante pé vasculhando os cômodos da casa escura. Sem encontrar nada de anormal relaxou um pouco e foi de volta ao quarto. Mas ao se aproximar da cama se assustou com um movimento na parede oposta ao lado aonde dormia. O coração acelerado demorou a bater no ritmo normal mesmo depois de ele perceber que havia se assustado com a sombra da sua cortina que a luz do poste projeta na parede. Deitou-se e dormiu por mais alguns minutos até que sentiu a vívida sensação de que alguém deitava em suas costas como se aninhando a ele. Em um movimento rápido se virou mas novamente nada viu. Não conseguiu dormir.
   No terceiro dia Nestor não conseguia se concentrar no trabalho devido aos acontecimentos da noite anterior e pela apreensão gerada por não encontrar sua esposa já há dois dias. Pediu licença ao chefe alegando um mal súbito e foi a casa. Para sua surpresa havia o mesmo bilhete no exato local onde o encontrara por duas vezes. Só que agora a mesa estava posta com vinho servido em duas taças. Bebeu todo o vinho deixando apenas uma das taças intocada. Com o passar das horas a noite mal dormida e o vinho o colocaram para dormir ali mesmo no chão da sala. Quando acordou era quase meia noite. Se levantou para ir deitar-se na cama quando viu as duas taças vazias na mesa.
   Acordou novamente as 3 horas da madrugada sentindo um corpo deitar-se ao seu lado. Abriu os olhos mas não se virou. Aguardou alguns segundos imóvel, provavelmente mais por não conseguir se mover do que por opção. Juntou suas forças e se virou. Viu apenas o bilhete embebido em vinho no travesseiro da esposa. Confuso voltou-se para o lado que estava anteriormente e viu sua esposa deitada de frente para ele. A pele pálida e fria parecia não ter expressão até que um sorriso malicioso surgiu e um grito lancinante foi ouvido na vizinhança.
   Alguns anos se passaram desde o desaparecimento do casal e algumas pessoas dizem por vezes sentir que existe alguém a observá-las enquanto dormem sozinhas.

sábado, 5 de maio de 2012

Diário da balança - o balanço diário da guerra contra o peso

Sou como algumas pessoas dizem, um rapaz de "ossos largos", "forte", "fofo", e já ouvi até "roxo" - sem referências a ex-presidentes e suas regiões anatômicas ditas violáceas. Meu nome é Alexandre, de onde os mais perspicazes, talvez não mais perspicazes e sim mais sádicos, já puderam adivinhar qual era meu apelido na adolescência - Alexandre, o grande. Além é claro dos mais comuns: free Willy, leitão, Faustão, Dino, orca-baleia-porca e outros nomes carinhosos. Desde pequeno, digo, novo ou criança, meu arquirrival e eu já duelávamos. Eram batalhas que normalmente ocorriam em terrenos neutros e sem espectadores, como na balança do banheiro. Mas embora eu tenha prolongado a guerra até os dias de hoje, nunca estive próximo de vencê-la. Até agora.
Alexandre, o graaaaaaaande.

domingo, 29 de abril de 2012

O que aconteceria comigo se...

...após muitos anos resolvesse finalmente comer salada.
   Depois de anos com uma dieta a base de carnes e produtos de origem animal, sentindo o peso da idade que chega e a responsabilidade de dar exemplo, me renderia enchendo o prato de salada no almoço. No início estranharia a textura das verduras e legumes frescos mas aos poucos me acostumaria. Até sentir como se algo estourasse na boca, seguido por um gosto levemente azedo. E ao olhar para o prato identificaria algo mexendo ao lado da alface.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Sobre atores e doces

   Os pais de Adolfinho haviam sido convidados para uma festa  de aniversário no interior. Após discutirem se iriam ou não, passaram a discutir se levariam o filho ou não. Optaram por levá-lo. Malas prontas, recomendações de comportamento feitas, pé na estrada. Ao chegarem na cidade estavam adiantados para a festa e passearam um pouco. Adolfinho corria por entre os bancos das praças, subia nos brinquedos e monumentos que havia lá. Passadas algumas horas se dirigiram até a festa que seria na casa do anfitrião - mesmo porque já não havia mais o que fazer na cidade. Lá chegando a festa ainda se encontrava em seus preparativos finais. Eles fizeram um tour pela casa e Adolfinho já não se mostrava tão animado e obedecia as ordens de se comportar bem. Entretanto o último cômodo da casa guardava uma visão deslumbrante para ele: como o  Didi reaparecendo por debaixo dos escombros e poeira no final de um filme dos trapalhões ele vislumbrou extasiado sobre uma mesa TODOS os doces feitos para a festa.
  É claro que após aquela porta ter se fechado atrás dele Adolfinho não conseguia pensar em mais nada a não ser em como retornar a sua Terra Prometida. Todos se dirigiram até a sala onde começaram a colocar a conversa em dia e, ao lado dos pais, ele se sentia no purgatório, e com Cérbero ao lado, vigiando e lembrando de que ainda existiam lugares piores. Até tentou distrair sua mente brincando com um boneco do He-Man mas a qualquer menção de movimento que o garoto fazia um olhar era desferido em sua direção relembrando qual era o comportamento esperado. Depois de algum tempo, frustrado, ele teve uma idéia que de tão simples havia lhe escapado: pediu para ir ao banheiro. Permissão concedida, agora já sentia os perfumes do Éden.
   Entrou na sala e não acendeu a luz. Com cuidado fechou a porta atrás de si e começou a comer os doces. Tomava o cuidado de ir comendo em pontos distantes uns dos outros e rearranjando os doces após retirar as forminhas vazias. E deleitou-se com os doces e com seu plano audacioso. Até quando estava com a boca cheia com dois brigadeiros e ouviu passos em direção a porta vindos do corredor. Num rápido giro retirou seu boneco do bolso e deitou-se no chão com os olhos fechados, fingindo dormir. A porta se abriu e ele ouviu a voz do dono da casa avisar seus pais que o havia encontrado dormindo no quarto, que devia ter entrado lá para brincar e acabara por cair no sono. Enquanto era carregado pelo pai até outro quarto para ser colocado em uma cama apreciou seu pensamento rápido novamente. Na cama com a luz apagada, pensou que deveria aguardar um tempo antes de "acordar" para comer mais quindins e bombons. Acabou por dormir de cansaço e não pode comer mais doces naquele dia. 

terça-feira, 17 de abril de 2012

Sob o brilho do Prata

Suas idéias eram antes vistas por si mesma como subversivas e, encaixotadas, empoeiravam nos armários da cabeça que se desorganizava. Não houve química, palavra ou ação que as libertassem por muito tempo. Mas pouco a pouco foram sendo lustradas e exibidas nas prateleiras dos armários, ainda não para serem vividas, só observadas. Hoje elas já foram promovidas e são experimentadas no outono do rio Prata.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Sobre organização e TOC

Sempre existia um jeito de fazer as coisas. Da organização com carrinhos ao manuseio das revistas em quadrinhos. Até na forma com que tomava banho. E por vezes, quando tudo já estava organizado, montava listas e organizava bandeiras dos países. Até treinou pintinhos que havia ganhado a andar em fila. CD's em ordem, talheres em ordem, livros em ordem, sinais de ordem em ordem, a cabeça nem tanto.

sábado, 31 de março de 2012

Ode ao bolinho

Para iníciar estes versos e ser bem entendido
por bolinho digo tudo aquilo que é comido

Empada, brigadeiro e salada com azeite
a mesa está posta para o nosso deleite

E o que no passado foi apenas nutrição
hoje atua em expandida proporção

Além de encher a pança e o apetite saciar
No primeiro chamado vem a ansiedade aliviar

Deixada clara aqui minha devota admiração
me recolho agora para uma bela refeição.

terça-feira, 20 de março de 2012

segunda-feira, 12 de março de 2012

O que aconteceria comigo se...

...após muitos anos decidisse usar o sistema público de transporte de Belo Horizonte.
   Após a formatura na faculdade comecei a trabalhar, logo estava de carro novo - símbolo da independência na nossa sociedade judaico-cristã-ocidental. Com isso deixei por anos de usar ônibus e o incipiente metrô da cidade para me locomover. Pois por uma dessas distrações da vida, suponhamos que o seguro do meu carro tenha expirado. Sem querer arriscar um bem tão valioso e fruto de trabalho árduo, resolvo ir de ônibus para o trabalho. Pesquiso na internet os horários e trajetos, faz tempo e não tenho tais informações - não gosto de surpresas, nem de chegar atrasado. Tudo anotado, acerto meu despertador e vou para a cama. No dia seguinte, estou no ponto cerca de 5 minutos antes do horário. Existem algumas pessoas, não muitas, é cedo e o bairro  constituído principalmente por famílias que possuem carros. No momento em que meu relógio marca a hora em que coletivo deveria passar sinto até uma leve palpitação, revivendo experiências, sabe como é. Entretanto ele não passa. Agora já são 10 minutos de atraso e o ponto está cheio. Pessoas se perguntam há quanto tempo estão esperando, se era comum haver atrasos, enquanto uma chuva fina começa. Então chega a notícia por um adolescente com uma mochila velha, fones de ouvido e um sorriso no canto da boca: os rodoviários entraram em greve.

sábado, 3 de março de 2012

Sobre esquinas e pães de queijo

Era a primeira vez que a mãe de Adolfinho o enviava sozinho até a padaria. Ela precisava de alguns complementos para o lanche da tarde e não poderia sair pois estava "fazendo sala" para a avó do menino. Então ele foi, com uma lista e o dinheiro até a padaria na rua paralela. Sentia-se importante, gente grande. Mas ao passar pela esquina se lembrou de quem era. Havia uma série de ítens lá e dentre eles alguns carrinhos de plástico. Como não havia ninguém por perto ele pegou os carrinhos abandonados, a vela e os fósforos - sábia e instintivamente deixando o frango com farofa e a garrafa de vinho para trás. Comprou o que tinha na lista e voltou. Quando estava livre de suas obrigações foi inaugurar seus carrinhos. Sentiu o cheiro dos pães de queijo que sua mãe tinha colocado no forno. E quando ela o foi chamar estranhou os brinquedos nunca vistos. E ao saber da procedência dos novos itens convocou todos a se juntarem em uma oração pela alma dos pães de queijo acesos com os fósforos do "trabalho" da esquina.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

O que aconteceria comigo se...

...por legítima defesa atirasse contra alguém.
   Suponhamos que em uma noite dessas um assaltante invadisse minha casa armado e, ao deixar sua arma sobre meu móvel da sala para pegar minha TV e levá-la para a varanda, eu tomasse a arma. Com raiva - provavelmente sob efeito de alguma substância - o bandido parte em minha direção. Assustado e sem nunca ter colocado a mão em uma arma de fogo, disparo. O projétil atinge a ulna do elemento provocando uma fratura exposta, deslocando um estilhaço do osso que ricocheteia e acerta minha artéria femoral. Enquanto sangro no chão em um choque hipovolêmico o meliante é encaminhado ao HPS com uma simples fratura no braço...

sábado, 28 de janeiro de 2012

Sobre hérois e calções de banho

     Toda sexta-feira a escola de Adolfinho deixava que os alunos levassem um brinquedo e os deixava interagindo com "coleguinhas" de todas as classes da mesma série no último horário. E para a última sexta-feira do ano havia uma prgramação especial: eles iriam à piscina! Por toda a semana a mãe de Adolfinho tentou em vão convencer o filho a não usar seu calção de banho favorito - subentende-se: velho. Ele tinha várias bolinhas coloridas sobre um fundo verde-limão, muito discreto. É provável que alguma linha de teoria do cuidado infantil tenha influenciado sua mãe quando ela escolheu esta sunga (i.e. a criança se torna visível e identificável até 1000 metros de distância). 
     Fato é que ao se arrumar para ir a escola Adolfinho quis já ir usando o calção como cueca para aula. Percebendo a impossibilidade de fazê-lo usar outra peça sua mãe consentiu. Ele estava radiante. Se sentia confiante com seu calção que o acompanhara em tantas aventuras imaginárias em clubes e praias. O problema é que o elástico já havia passado do seu melhor momento e ao andar começava a cair. Adolfinho precisou até entrar no banheiro na hora do recreio para resgatá-lo de suas pernas. E passou a ficar temeroso de que ao entrar na piscina seu calção saísse na frente de todos. 
     Durante a brincadeira na área da piscina ele ficou próximo ao muro, sem querer entrar na água. Triste por não aproveitar a situação tão esperada Adolfinho abriu sua mochila em busca de uma revistinha para ler. Neste momento ele viu na sua "mochila de utilidades" a ferramenta que liberaria o herói aprisionado: o grampeador.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Mascotes

Um dia desses ouvi de um comentarista na TV "o mascote da copa no Brasil deve ter um apelo ligado à nossa imagem internacional, como um macaco...". Já para começo de conversa afirmo ser adepto da teoria evolucionista com ancestral comum entre homens e macacos e tal. Mas também é claro o teor preconceituoso e degradante que a expressão pode conter. Dito isso continuemos com a linha de pensamento. É certo que a nossa imagem lá fora não é das melhores. Só não acredito que devemos incorporá-la como uma verdade eterna. Acho que podemos refletir sobre os motivos de passarmos tal impressão e destilar alguns aspectos realmente negativos e mudá-los para melhorar nossa sociedade. Ou estou errado e o melhor mascote seria o Pelezinho na Marquês de Sapucaí, com uma xícara de café em uma mão e um mico leão dourado no ombro.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Quarto de irmã


Ao primeiro olhar o quarto pode parecer pouco convidativo, confuso, sem padrão de organização. Mas o que é um padrão de organização senão o fato da gente gostar do jeito da nossa própria desordem. Bem ao lado da porta, logo ao entrar, há uma penteadeira com um enorme espelho a desafiar quem entra a olhar para si mesmo. O rack da TV e DVD, todos com uma grande folha corrida, seguem com seus préstimos a exibir constantemente séries cômicas variadas colorindo o quarto. Em outras épocas estavam sempre sintonizados em sizudos jornais que fechavam um pouco o ambiente. O armário sempre tem uma ou mais portas abertas, expondo seu interior um pouco a quem chega. Roupas, livros, bolsas, vídeos, sapatos e badulaques. A nova/velha cama lembrando que oportunidades e sonhos por vezes podem ser aproveitados se um pouco adaptados. E sempre com um edredon casualmente desarrumado por cima nos lembra onde fica a "Pedra do Rei". Sua escrivaninha com o computador, CDs, DVDs, livros, contas, lembretes de afazeres domésticos, post its com assuntos de trabalho, fotos, cartões postais, correspondências antigas, vários lápis vermelhos, uma grande edição sobre a vida e obra de Dali evidencia parte de sua complexidade. O vaso de flores desenhado a giz de cera na parede, em um ato que beira a liberdade infantil, colocado ao lado de sua janela com grades. Uma bandeja que recolhe a água que teima em pingar e desníveis no assoalho simbolizam o inexorável passar do tempo. Passar de quartos. Quarto que tinha um aquário, muitas vezes vazio(a). Quarto que tinha um belo móvel com som moderno, TV grande e DVD - independente. Quarto azul com a moça do violino presa na parede e um futon improvisado, dolorida fuga. Quarto de agora, memória viva de sua vivência. Quarto que nos faz sentir em casa no mais acolhedor sentido da palavra.

A opressão do self

Espero que a Karina não tenha esquecido seu lanchinho Foi preparado com amor e carinho Nesse cotidiano cada vez mais mesquinho É preciso um ...